sexta-feira, maio 09, 2014

                                            Óbito Republicano (Parte I).

Cansado de ouvir reclamações sobre a situação do país, resolvi, então, parar e analisar algumas das principais queixas dos cidadãos brasileiros, costumeiramente manifestadas nas mídias e, recentemente, em protestos de grandes proporções. Reflexo da atual conjuntura política e econômica do Brasil, tal descontentamento é carregado de um tom pessimista e nada confortador. As pessoas, simplesmente, não acreditam mais na possibilidade de mudança em áreas de inigualável importância como é a área política/econômica e social, por exemplo.
Isto se deve ao fato de que elas não veem nada sendo realizado ao longo dos governos presidencialistas. Pois, o que é feito neste país, corresponde a medidas paliativas que em nada atendem a legítima necessidade popular.  Atualmente, caminhamos para mais um pleito e nele se apresentam àqueles em busca do tão sonhado cargo presidencial. Contudo, o quadro fica ainda mais pessimista se analisarmos os candidatos que ai estão.
 Candidatos despreparados (movidos em sua maioria pelo ego e o status quo), alianças entre partidos e pessoas (reconhecidamente divergentes), outros, alienados e envaidecidos por se considerarem herdeiros de um passado alheio (cito os fanáticos idolatras da utópica ideologia de Marx que convenhamos em nada difere do nazi-fascismo já que seus exemplos de terror se alastram mundo a fora, basta vermos a conturbada vida da Coreia do Norte e da Venezuela, por exemplo). Ideias e ações marxistas nunca foram sinônimos de boa política ou gestão, a história da humanidade nos comprova isso. Portanto, não podem ofertar mudanças senão àquelas já conhecidas (Totalitarismo / Intolerância) e das quais nenhuma população do planeta deseja vivenciar. De acordo com essa composição fica claro que seguem abertos os portões do inferno sobre o gigante adormecido em berço esplendido.
Pois bem, esses candidatos se dizem “diferentes” e prontos a resolver os problemas de mais de um século de República em apenas quatro anos! Desculpem, são mágicos e não presidenciáveis. Infelizmente, a realidade nos mostra que são incapazes de ofertar algo novo ou de propor continuidade aos bons projetos que, comumente, são “emperrados” em detrimento daqueles que oferecem enriquecimento pessoal, rápido e ilícito. Conclusão: pouco importa se elegermos o candidato do Partido Político “X” ou “Y”, nada será alterado a nosso favor, pois o que prevalecerá serão as ideias partidárias. Sendo assim, não se iludam, continuaremos a ser um país governado de acordo com interesses pessoais e/ou de grupos empresariais dispostos a financiar lobbies e campanhas políticas em troca de benefícios futuros, o famoso “toma lá dá cá”.
Ao que parece, também, seguiremos reclamando dos políticos e de suas “maracutaias” avalizadas por meio desses onerosos e intermináveis processos eleitorais. Nada mais nos resta senão vivermos constantemente em meio a uma eleição qualquer, comícios e propagandas eleitorais sem esclarecimentos e sem uma proposta coerente de plataforma de governo. Democracia (“Poder do Povo”) deveria ser usada em sua essência; homens livres votando em homens livres. Isso significa dizer, respectivamente: sem coerção ao voto e sem legendas políticas ou falsas ideologias que apenas servem para tumultuar e transformar o país em um verdadeiro ringue eleitoral; local onde não existem escrúpulos para alcançar o objetivo e de onde, apenas, o povo sai prejudicado.   
Meus caros!  Não haverá mudança se não acordarmos desse pesadelo. Não haverá mudanças se não percebermos a balburdia em que estamos inseridos desde que foi instaurada essa FATÍDICA REPÚBLICA em 1889. Desdobramos-nos em governos formados por grupos oligárquicos (cujo interesse pessoal sempre se sobrepôs aos interesses públicos) e ditadores (civis e militares) que em uma tentativa vã de embalar a República, por eles parida, ainda discursam sobre os parcos feitos de um passado que não apresenta glórias e sim GOLPES e INJUSTIÇAS que se sucederam ao longo do último século e que não causaram outra coisa senão prejuízos de todas as ordens; verdadeiras chagas que ainda fazem sangrar gerações de brasileiros.
Estamos feridos em nossa dignidade, atordoados pela alienação política que nos foi imposta pelos governos e ideais republicanos. Vivemos, desde então, nesse mundo conturbado de onde fomos doutrinados a ver, passivamente, os erros se sucederem sem que nos manifestássemos de forma contumaz. Está na hora de pensarmos seriamente sobre o fim da República Federativa do Brasil e de propormos uma virada histórica na vida desse país, uma vez que, a existência dessas desordens deve-se ao fato de não possuirmos o sangue republicano correndo em nossas veias. Nem mesmo nossos políticos o possuem!
Somos uma sociedade MONARQUISTA na ESSÊNCIA. Isso significa dizer que na origem de tudo e de toda nossa história figura a ilustre presença de nosso passado monárquico e de sua continuidade perpetrada também na continuidade de suas instituições estáveis e, acima de tudo, confiáveis. Hoje, não existe nem continuidade e muito menos projetos para o futuro. Sem projeções para os próximos 10, 20, 50 anos não há como entendermos qual é, de fato, nosso papel no mundo, nem ao menos, se queremos fazer parte de um mundo civilizado com garantias governamentais sobre sua política - interna e/ou externa - da qual resultaria a tão sonhada melhora na qualidade de vida do nosso povo. Essas características são indispensáveis para a boa gestão de uma nação. Saber o se posicionar de forma estratégica em meio às mudanças que ocorrem é essencial para que o país tenha uma identidade. Vejamos como exemplos as monarquias, seculares, que ainda vigoram com inabalável credibilidade ao redor do mundo.
Ao lembrar que temos sangue MONÁRQUICO, logo percebi, também, que isso está permeado em todas as instancias de nossas vidas, seja no meio familiar ou no profissional. Infelizmente, não nos damos conta, mas inconscientemente reproduzimos palavras e ações que nos remetem ao nosso glorioso passado Imperial. É fácil distinguirmos isso se estivermos abertos para esse entendimento, pois os exemplos são os mais variados... Imaginem se um empresário seguiria o atual padrão eleitoral para eleger – de quatro em quatro anos – um desconhecido, um aventureiro, como novo mandatário da indústria ou comercio do qual é dono (a), naturalmente que não faria isso. Pois, a classe empresarial também reproduz o estilo monarca de governo e sucessão. É mais provável que seus filhos ou familiares assumam e prolonguem seu patrimônio, tal qual em um reinado.
 Percebam, ainda, que nosso presidente (a) ou governador (a) tem como residência oficial um Palácio. Palácio do Planalto (Federal) e Palácio Piratini (RS), respectivamente. Em contrapartida, nos consideramos reis e rainhas dentro de nosso lar, isso tudo, sem mencionar nossos verdadeiros heróis que remontam à época do Império. E, por falar nisso, tenho que citar nosso último grande governante – reconhecido internacionalmente por sua capacidade e preparo intelectual – Dom Pedro II. São essas as referências que nos fazem olhar para outros países – ditos de primeiro mundo - com suas famílias reais - com profundo respeito e com a nostalgia de quem um dia pertenceu a esse seleto grupo. Hoje assistimos o sucateamento e a desmoralização de nossas instituições, uma desvirtuação de todos os princípios outrora construídos em torno da ética e do respeito à nação brasileira e de seus habitantes. Vejamos, como exemplo, a indecisão constitucional, decorrente da republica, um verdadeiro caos.
Se durante o Império (67 anos) tínhamos uma constituição que salientava a liberdade da nação, pois esta era vista como o berço de todas as projeções sociais e também um repositório essencial dos valores e pretensões de todos os brasileiros, durante a República (125 anos) não conseguimos se quer manter a primeira e atualmente estamos na sexta constituição (a última de 1988). É verdade que a atual é tida como a melhor de todos os governos republicanos, no que se refere aos direitos individuais, mas também é fato que foi feita em meio aos clamores latentes de um povo que acabara de sair de mais uma crise ditatorial imposta pelo próprio Sistema republicano; portanto permeada de falhas e exageros que, hoje, geram dúvidas e deliberações equivocadas, por parte de nosso judiciário, penalizando a sociedade de bem que pouco ou nada conhecem de seus direitos, pois a república nos delega uma educação de péssima qualidade, compreensível, pois não é de seu interesse ter um povo instruído já que ela se sustenta pelos votos de milhões de analfabetos funcionais.
Sendo assim, é sem pesar algum que venho a todos anunciar a morte da, outrora, promissora, República. Instaurada pelo maior de todos os golpes Militares tal sistema agonizou desde o parto por mais de 120 anos e ao que se sabe não deixará saudades nos corações brasileiros. Está na hora de protestarmos por algo que realmente vale a pena. É chegada a hora de reivindicarmos uma mudança radical no sistema de governo, pois o atual não atendeu e nem atenderá as necessidades de um povo que sonha em ser grande. Entenda-se aqui que o “ser grande” não é apenas ser reconhecido internacionalmente pelo futebol, violência, corrupção ou pela putaria a que esse pais foi entregue pelas mãos republicanas.
Devemos e queremos ser reconhecidos pela capacidade de atender a população em seus anseios básicos, como o direito a moradia digna, saneamento, assistência médica, educação de qualidade, segurança, igualdade de direitos, entre tantos outros de igual importância... E àqueles que acham que estou sendo saudosista e/ou conspirando contra essa República de “Faz de Conta”, então, antes de criticarem, peço encarecidamente, que abram um bom livro de história (Jamais os do MEC), leiam e comparem os dois sistemas de governo. Feito isso, verão que a descontinuidade de ideias e projetos é o que uma República tem a nos oferecer. Verão, ainda, que perdemos tempo, dinheiro e, principalmente, vidas em prol de um projeto enganoso do qual nada obtivemos em troca senão a alienação, pobreza e a certeza de caminharmos para o abismo...


Paulo E. Ramos.

sábado, dezembro 22, 2012

Leandro Karnal. Conversas com um Jovem Professor.

Ao terminar a leitura do livro, de Leandro Karnal, confesso que fiquei em dúvida quanto à forma de ser feita esse fichamento. Isto porque, diferente dos outros textos e de outros fichamentos, sobre o assunto, este não pareceu ser mais um grande livro com receitas milagrosas para um “bolo perfeito”.  Encontrei sugestões muito claras. A simplicidade e a objetividade surpreenderam-me. Conversas com um jovem professor, trata-se de um diário aberto a todos os professores em início de carreira, no entanto, acredito que sirva, também, para os mais experientes como forma de reflexão ao trabalho realizado e/ou  que vem sendo feito. Ao ler o livro, certamente, a pessoa irá se surpreender com algumas atitudes e experiências vividas pelo autor no decorrer dos seus trinta anos de magistério. Em seu livro procura falar de forma coloquial, de igual para igual, de modo direto e claro, com todos seus colegas de profissão, apresentando os erros e acertos cometidos em sala de aula e no convívio com os demais professores. A narrativa começa com uma breve descrição dos motivos que o levaram (juntamente com sua irmã, Rose Karnal) a escrever tal livro. Segue, posteriormente, enumerando fatos e exemplos das mais variadas situações encontradas em sala de aula. Para tanto, logo de início analisa, através de um ponto de vista prático, o que seria uma “boa aula” e conclui dizendo que para tal é necessário que haja o cruzamento de quatro linhas de força, ou seja: você, o conteúdo, as condições internas e externas, bem como, o próprio aluno. Entre outras coisas, avalia também o tom de voz empregado. Pois, segundo o autor, “ouvir alguém induz ao sono. E se esta voz for contínua e no mesmo tom o tempo todo, funciona como uma hipnose”. Nesse caso, o ideal seria sempre falar “mais alto” e “mais baixo”, de acordo com o que se quer transmitir. Adverte, nesse caso, para que a linguagem corporal do professor também seja apropriada e não transmita a idéia ou o ritmo de um cortejo fúnebre. Pois, de nada adianta saber falar e gesticular se a aula não for bem planejada. Para isso, Karnal reservou algumas linhas onde cita exemplos de como preparar uma aula sem que seja uma tarefa cansativa ou improdutiva para o professor. Suas citações são exemplos empregados ao longo do tempo, outras, nos convida a refletirmos sobre o seu uso, principalmente, ao lidarmos com as diferentes situações que se apresentam, como por exemplo: a preparação da prova, o dia da prova, a aplicação e a correção desta, bem como, a sua entrega. Além disso, nos alerta para os cuidados a serem tomados em dia de conselho de classe ou na simples escolha da tecnologia a ser usada em aula. Dessa forma, segue roteirizando suas experiências com a finalidade única de apresentar aos novatos a rotina encontrada em uma escola, bem como, as questões que envolvem o convívio com seus superiores, pais e colegas de trabalho. Ao descrever cada uma das situações, Leandro Karnal, também nos alerta sobre a necessidade de agirmos cuidadosamente com as palavras durante esses encontros, pois cada parte possui um ponto de vista a ser levado em consideração e você pode não estar incluso nele. 

Bibliografia: Karnal, Leandro. Conversas com um Jovem Professor / Leandro Karnal (com a colaboração de Rose Karnal). São Paulo; Contexto, 2012.

Paulo E. Ramos.

Minhas memórias do tempo de escola.

Meu nome é Paulo Eduardo Ramos, tenho trinta e três anos de idade, muita memória e pouco cabelo. A história que segue teve início no já distante ano de 1985, porém, ainda lembro quando, surpreendido, por um convite materno, aceitei visitar minha irmã. Fiquei surpreso, pois não sabia onde ela estava nem o que fazia toda manhã, quando, ainda cedinho, deixava a nossa casa. Entretanto, confiava no que minha mãe dizia e isso, às vezes me bastava. _ “Tua irmã foi pro colégio estudar”. Naquela manhã a felicidade foi grande, pois, enfim, iria desvendar um grande mistério. Sempre demonstrei preocupação com as coisas e principalmente com as pessoas. Minha irmã era acima de tudo a minha melhor amiga. Era com ela que eu passava a maior parte do tempo, portanto, era natural que eu me preocupasse a ponto de querer saber o que ela fazia longe de casa. Então, agarrado por uma das mãos, fui conduzido até um prédio muito estranho que, por incrível que pareça, não ficava tão longe da minha casa. Lembro que nem fiquei cansado, isso era um bom sinal, pois quando se é criança as distâncias são medidas pelo cansaço da caminhada. Para mim aquela era uma casa imensa. Logo ao chegar perguntei para minha mãe se ali morava uma família muito grande. Ela me respondeu, ainda fechando o guarda-chuva, que aquele era um local onde as pessoas iam aprender a ler e a escrever ou como ela mesma concluiu: _”Um lugar onde todo mundo vem pra ser alguém na vida”. “Ser alguém na vida”.  Confesso que essas palavras me atormentaram por um bom tempo, ainda hoje me pergunto sobre o seu real significado. Mas, naquele momento, nada poderia ter me causado maior espanto do que o susto que levei ao escutar uma sineta tocar. Uma mulher gorda, com um sino na mão, percorreu os corredores alardeando algo. Descobri, mais tarde, por intermédio de minha mãe, que se tratava de um sinal para que os alunos viessem comer a merenda dada pela escola. Pronto, o lugar havia me conquistado. E olha que eu me deixei conquistar por um prato de comida que nem provei. Porém, toda vez que entro em um colégio, ainda, sou capaz de sentir o mesmo cheiro e vislumbrar as mesmas cenas. É impossível, para mim, não ter tais lembranças: o aroma que vinha da cantina, as mãos e a manga do casaco levemente molhados pela garoa, minha mãe toda apressada (tinha que voltar pra casa e fazer almoço), a merendeira gorda com o sino na mão, as crianças correndo num barulho frenético... Enfim, aqueles minutos me bastaram para desejar freqüentar aquele local pro resto da minha vida. Entretanto, teria que esperar até o próximo ano. Naquele momento, ainda não tinha a idade exigida. Minha Irmã, três anos mais velha, estava ali e insisti em vê-la. Qual foi minha surpresa ao entrar em uma sala toda decorada com letras gigantes e desenhos espalhados por todo o local? Fiquei eufórico! Convenci mãe e professora a me deixar ficar. Permaneci ao lado de minha irmã e com ela pintei e rabisquei alguns livros ilustrados. Brinquei e sorri como se aluno fosse. Essa é a memória que tenho ao entrar em um colégio pela primeira vez em minha vida. Não se trata do primeiro dia de aula, pois o que guardo com carinho é exatamente o que descrevi acima. Se a primeira lembrança é a que fica, confesso que o ditado nunca esteve tão certo, ao menos para mim. Pois, nenhuma outra lembrança escolar é mais valiosa do que essa. Como disse anteriormente, não posso me referir ao primeiro dia de aula como me refiro às lembranças que guardei ao visitar minha irmã naquele colégio. Não posso fazer isso, pois quando entrei na primeira “série” as coisas não aconteceram como sonhava ou como imaginava que seria. Meu primeiro dia de aula, no Colégio Cenecista de 1° e 2° Grau Sepé Tiarajú, foi assustador. Chorei e pedi pra ir embora, mas logo fui persuadido, pelo diretor, a continuar. Permaneci sentado, com um choro preso na garganta, um nó que só aumentava toda vez que um coleguinha me olhava com olhos de desprezo ou de espanto. Ainda, hoje, não sei descrever. De qualquer forma, não tive um bom começo em minha vida estudantil. Incrivelmente, fui aprender a ler apenas na terceira “série”. Já me perguntaram como isso pôde acontecer. Acho que tive muita sorte, pois a professora foi a mesma durante os três primeiros anos letivos e o seu método também. Ela não costumava tomar nossa leitura e quando fazia era sempre da mesma forma, ou seja: em voz alta, cada aluno lia uma pequena parte do texto que era passado no quadro. Como eu já estava acostumado com aquilo nunca sentava nas fileiras do canto ou no início delas. Posicionava-me, estrategicamente, sempre no centro da turma, pois quando chegava a minha vez de ler, eu, já havia decorado todo o texto. E do ponto onde o colega (anterior a mim) havia parado, eu continuava. Nunca esqueci uma linha se quer. Isto poderia ter me causado graves problemas, mas nunca causou. A verdade é que exercitei tanto meu poder de concentração que, hoje, jamais esqueço o que me falam. Sempre que escuto algo com atenção é como se tivesse anotado em um papel. Acesso meu “arquivo cerebral” e lá está o que desejo: conversas, imagens, etc.  É verdade que nem tudo são flores, ainda guardo algumas deficiências que credito a má formação inicial. As coisas melhoraram apenas na quinta “série”, depois de repeti-la por duas vezes, é claro. Gostaria muito de seguir dizendo que fui um excelente aluno, mas na verdade nunca me interessei, até então, por absolutamente nada. Minha preocupação não era a escola e sim o que acontecia em casa com minha mãe e irmã. Pessoas com quem compartilhei inúmeras aflições. Falo isso, porque meu pai não foi um exemplo de bom marido ou de pai adorado. Quase não o via em casa e quando isso acontecia dificilmente passávamos sem que acontecesse algo desagradável. Infelizmente, o convívio com estranhos e com a polícia, batendo a nossa porta, era mais comum do que com os poucos amigos que tinha. As relações escolares não poderiam ser outras, senão baixo desempenho e excesso de faltas. O tempo passou até que me desse conta de que eu precisava mudar e não repetir o que via tão costumeiramente nas ruas ou nos locais que frequentava. No ano de 1992 consegui enfim sair da quinta série. Foi um alívio, pois pensava muito em desistir da sala de aula, talvez, ir trabalhar ou então, roubar. Confesso que a última opção me parecia mais atraente. Pois aos poucos me tornava tão ou mais bruto que meu pai.  Felizmente, nem os “amigos do crime” nem as drogas que, a todo instante, se apresentavam me convenceram de que aquele era o melhor caminho. Trabalhei ao mesmo tempo em que completei o ensino fundamental. Quando, enfim, cheguei ao ensino médio, pude perceber que poderia fazer algo diferente de todas as pessoas que conhecia. Poderia ter um futuro promissor, desde que eu fizesse as coisas acontecerem. Completei o ensino médio e com ele o curso técnico em contabilidade. Parecia estar decidido no que fazer da minha vida, assim que deixasse o colégio. Entretanto, optei pelo curso de Direito. A idéia de confrontar um criminoso no tribunal ou de livrar alguém de uma condenação certa passou a falar mais alto. Direito Penal. Falei, respirei e comentei com todos sobre meu desejo. O ano era 1999. A prova do vestibular foi feita e o desejo realizado. Satisfação garantida ao ver que os dois meses de estudo (com livros emprestados) sobre o balcão de um pequeno armazém não foram em vão. Fui aprovado. Antes de falar, sobre a breve tentativa de me tornar um advogado, preciso comentar sobre as boas coisas e os bons amigos que encontrei durante o “segundo grau”, ou como ele é chamado hoje: Ensino Médio. Nossa vida é feita daquilo que plantamos pelo caminho e uma dessas coisas certamente é a amizade. A boa e velha amizade, com todos seus encantos e lembranças. Algo “que não se apaga com o tempo, tão pouco, transforma-se em filhos que dizem adeus”; como diria o poeta. Fiz bons amigos. Com muitos compartilhei histórias e aventuras por toda a cidade de Santo Ângelo, interior do Rio Grande do Sul, onde nasci e vivi até os meus vinte anos de idade. Adelar Bieger, Edson Antunes, Rafael Lottermann, Alcione Webrath, Rafael Matte, enfim. De todos tenho lembranças, sendo que os dois primeiros tiveram maior importância antes de me tornar um adolescente. Os demais fizeram parte de um convívio escolar, e, porque não dizer, das primeiras festas, das primeiras noites em que vagávamos pela cidade dentro de uma Wariant velha com bancos rasgados, sem rádio e com problemas mecânicos. Pra quem não lembra, Wariant era um carro muito parecido com a Brasília. Lembro que toda vez que saíamos levávamos um aparelho de som junto. O problema é que a gurizada ou reunia dinheiro pra comprar bêbida ou reunia dinheiro para comprar pilhas. Só assim era possível alimentar aquele monstro gigantesco que ocupava quase todo o interior da parte traseira da Wariant. Este carro foi responsável por momentos hilários que jamais se apagarão da minha memória. Creio que da memória deles também não. Esses amigos foram importantes, pois, com eles, esquecia da realidade e me tornava um adolescente de verdade. Foram os amigos, Alcione Webrath e Rafael Matte, que me influenciaram a desejar o ensino superior. Na época todos só falavam em vestibular e no curso que fariam caso fossem aprovados. Eu não falava nada. Pois, diferentemente dos outros, não tinha a mínima condição de continuar estudando ou de pagar um cursinho. Até que um belo dia, ao passar em frente a faculdade de Direito IESA, as palavras dos meus amigos vieram à tona. Então, resolvi arriscar mesmo sem saber ao certo se poderia comparecer no dia do tal vestibular. Como já foi dito, o dia da prova chegou e com ele a certeza de que o esforço feito seria recompensado. Estava certo. Fui aprovado, mas a realidade financeira não permitiu que eu estudasse. Meus sonhos seriam adiados ou cancelados, dependendo do que acontecesse nos próximos dias. Eu estava com dezenove anos e não havia como continuar morando com meu pai. Precisava sair de casa, já que ele me cobrava isso. Aos vinte anos de idade, sabendo das condições em que me encontrava, recebi e aceitei o convite do meu padrasto e da minha mãe (que a essa altura já morava em Canoas há seis anos) para morar com eles. Minha irmã havia casado, portanto, haveria lugar para mim. Ao chegar à nova cidade trabalhei durante dois anos sem ao menos pensar em estudar novamente. Foi somente no ano de 2001 que, por um motivo peculiar, resolvi me aventurar no vestibular da Unisinos. Antes de tudo, preciso dizer que já havia desistido do curso de Direito. Por algum motivo aquilo lembrava um tempo que eu queria esquecer. Eu estava em outra cidade, vivendo uma nova experiência. Achei que seria melhor deixar, absolutamente, tudo para trás. E isso também era válido para os velhos planos. O curso de História surgiu ao acaso, então, pensei: “sempre gostei de história, no colégio tirava boas notas, e a idéia de ser professor não é tão ruim assim; vou fazer”! Entretanto, a escolha pelo vestibular escondia uma verdade absoluta. Meu trabalho era braçal, algo muito cansativo (trabalhava em uma empresa de GLP, gás de cozinha), não havia lugar em meu corpo que a dor não estava presente. Fiz a inscrição para faltar ao trabalho e com isso ter um descanso. Isso mesmo! Foi um motivo para faltar ao trabalho. O vestibular foi uma boa justificativa, naquele início de semana, melhor até do que a doação de sangue. Contudo, hoje, acredito ter feito uma boa escolha. A idéia de ser chamado de professor, de estar presente no ambiente escolar interagindo com alunos, pais e colegas de profissão me contagiaram completamente. A Unisinos e o curso de História entraram em minha vida por intermédio do destino. Naquele momento não sabia o que fazer. Nem ao menos sabia se faria algo ou alguma coisa em beneficio da minha vida profissional. Quando, enfim, percebi, já estava fazendo. Foram muitos os amigos que fiz no curso superior. A lista é grande, teve início em 2001. No entanto, acredito que seja o único, daquela velha turma, que ainda permanece na Universidade. Todos os demais já estão formados. Alguns trabalham como professores, outros não. Gostaria de ter me formado e já estar dando aula, mas alguns problemas antigos insistiram em me perseguir, mesmo em outra cidade. O principal de todos foi o financeiro. Outra vez o financeiro. Há muito tempo atrás eu havia jurado que isso não seria mais problema e mesmo com todas as dificuldades que se apresentaram no decorrer dessa jornada, hoje, estou prestes a concluir o que comecei. Investi tempo, dinheiro, mais dinheiro e dois carros que adquiri ao longo desse percurso. Tudo pra ser um professor. Uma profissão tão digna, porém, como se sabe, pouco valorizada por nossas autoridades. Mesmo assim, tenho orgulho em dizer que serei um professor e espero fazer o que, muitas vezes, esperei que fizessem por mim. Pois, acredito que lecionar não é apenas repetir o que os livros nos apresentam. Acredito que o professor, por excelência, é um ser capaz de interagir profundamente com meio no qual está inserido. Espero fazer a diferença para alguém. Espero ensinar e auxiliar meus futuros alunos, naquilo que for necessário, para que se tornem pessoas de bem e porque não dizer: que eles também possam guardar e transmitir, para quem quer que seja, as boas memórias do tempo de escola, inclusive desse professor.

Paulo E. Ramos.

Fim do Século na América Latina: êxitos econômicos, frustrações sociais e desenganos políticos (1999 – 2000).

No inicio dos anos noventa a América Latina apresentou uma notável recuperação econômica que logo a colocou entre as principais zonas emergentes do planeta, entretanto, mostrou-se vulnerável as turbulências internacionais e também às reformas no campo social. No plano político, a incapacidade dos governos para resolver problemas relacionados à violência e corrupção gerou um profundo desencanto com relação ao funcionamento da democracia ainda fragilizada. Em diversos países se registraram situações de ingovernabilidade; do ponto de vista interno surgiram líderes neopopulistas. Já do ponto de vista externo relançou-se a integração regional numa tentativa de criar instrumentos de gestão pública regional. Surge uma América Latina mais confiante em especial ao que se refere às negociações com os EUA. Tal recuperação econômica deveu-se em muito a uma nova forma de administração que incorporava itens, antes inimagináveis para os padrões de administração latina, tipo: privatizações e reformas sociais. A abertura das economias seguiu progredindo na segunda metade dos anos noventa, com exceção da Colômbia e da Bolívia. Com isso, os resultados das reformas apontaram um crescimento econômico e de estabilização formidável, mas foi o controle da inflação que contribuiu para impulsionar novamente alguns países. Infelizmente as ações positivas no campo econômico não se estenderam até as classes menos favorecidas, pois os índices de desenvolvimento humano e social ainda estavam abaixo dos índices asiáticos, por exemplo. A desigualdade e a violência ainda assolavam a América Latina. Ao final do século XX e início do XXI a América Latina era seguramente o continente mais violento do mundo. Tal violência afetou também as relações sociais, já corrompidas por uma rivalidade, inclusive de ódio, que se apoderou de certos espaços sociais excluídos pelo poder público que se debatia nas alternâncias e pactos políticos em busca de votos para uma possível eleição ou reeleição. Com os candidatos já eleitos surgiram alguns modelos de pactos para governar, no entanto, foram insuficientes para dissolver os problemas de governabilidade das democracias latino-americanas uma vez que duravam pouco e eram constantemente pressionados pelas exigências da economia mundial. Pode-se dizer que surgiram sim vários desenganos políticos em meio a todas essas mudanças, como alguns Presidentes que não corresponderam ao esperado devido à falta de qualificação ou apoio político. Outros demonstraram certa afinidade com modelos de cunho revolucionário/socialista. Métodos ultrapassados de governo cujo potencial é propício para desencadear novas ditaduras como no caso da Venezuela que vive atualmente numa espécie de regime político “maquiado” por uma tentativa revolucionaria e socialista. Atitude deslocada de seu tempo, algo totalmente desproporcional diante do contexto que se apresenta o início do século XXI. De resto, o que ficou foi a tentativa de uma aproximação maior entre as nações; uma integração regional que teve início, principalmente, com a criação de blocos de cooperação econômica, como o MERCOSUL, por exemplo.

Paulo E. Ramos.

América - Latina. Os Anos Sombrios.

Os anos sombrios se caracterizam pelo período compreendido, principalmente, entre a Revolução Peruana de 1968 e a Nicaraguense de 1979, pois o contexto que se seguiu foi de um panorama autoritário, violento e sanguinário, em praticamente toda a América Latina. Enquanto que no cenário internacional as potencias mundiais convergiam para um melhor entendimento, demarcando sua área de ação, o “terceiro mundo” se fazia presente afirmando-se como um importante ator na medida em que seu território também se transformava em cenário desses enfrentamentos ideológicos, uma vez que o nacionalismo existente era grande e contribuía para que essas novas expressões políticas pudessem modificar o seu panorama nacional. Os anos de 1968 1969 marcam a criação da CECLA (Comissão Especial de Coordenação Latino-Americana) dentro da OEA. Era nada mais do que a vontade latino-americana de se fazer ouvir. Pois, através dessa comissão de vozes que denunciavam os EUA de impedir o desenvolvimento da região ficava mais evidente. Esse descontentamento era revelado sistematicamente pelos líderes de esquerda que aproveitaram o momento para realizar ações de cunho socialista, por exemplo: A Revolução Humanista no Peru que se concretizou ao apoiar reformas fundamentais como a agrária. Os governos revolucionários geralmente caracterizavam-se pela vontade de modificar a estrutura piramidal da sociedade e para isso não se cansavam em mobilizar os setores mais desfavorecidos das classes sociais. Tal ação foi comum em diferentes países da América Latina. O que os diferenciavam eram algumas peculiaridades regionais. No Peru, na Bolívia, na Nicarágua, no Chile, Argentina, Uruguai... todos sem exceção foram movidos pela vontade de fazer algo diferente, no entanto, devido às características de sua economia e principalmente de seu povo é que essa mudanças se tornavam algo mais traumático do que em outros lugares. Dessa forma, a América Latina entrou nos anos setenta com um modelo de desenvolvimento praticamente igual à de anos anteriores. A industrialização por substituição de importações trouxe certo crescimento, entretanto, trouxe também muitos desequilíbrios, principalmente, no campo social onde observamos um favorecimento às elites oligárquicas em detrimento das classes operarias, algo também visto no âmbito econômico. Se confrontarmos esses dados com o crescimento demográfico ocorrido, iremos perceber  que o número da pobreza aumentara consideravelmente. Como se percebe, esse modelo industrial, permitido pelos EUA à America Latina, era capaz de suprir o mercado interno basicamente de produtos dispensáveis a grande maioria da população, sendo necessário que as importações (em sua grande maioria estadunidense) continuassem em ritmo acelerado, manifestando um déficit crônico na balança comercial desses países. Diante dessas agitações, os movimentos sociais reagiram e foram repreendidos violentamente. Contudo, as manifestações não pararam e encontraram abrigo na classe operaria, nos movimentos estudantis e em diversos setores do núcleo urbano e rural. Tais movimentos entraram em efervescência uma vez que diferentes ditaduras instalaram-se em praticamente toda a latino-américa.

Paulo E. Ramos.